Takeko Ishida

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===TAKEKO ISHIDA=== ===TAKEKO ISHIDA===

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TAKEKO ISHIDA

Takeko Hagiwara chegou ao Brasil no dia 08 de dezembro de 1932, a bordo do navio Montevidéo Maru, acompanhando o futuro sogro Tsunejiro Ishida. Ela havia concluído o curso normal no Japão, meio ano antes, aos 17 anos, e vivia com a família em Honjo, província de Saitama, quando seu pai recebeu uma carta de um tio dela, capitão reformado da Marinha. O conteúdo dizia que um ex-companheiro da Marinha, Sr. Tsunejiro Ishida, havia retornado ao Japão, vindo do distante país da América do Sul, Brasil, especialmente para procurar uma noiva ao filho, e que havia indicado sua primogênita, Mutsuko, para isso.

Tudo começou porque, entusiasmado pela indicação, o Sr. Tsunejiro resolvera visitar a família. Preocupado com a vinda dele, o pai chamou a filha indicada para falar-lhe a respeito. Ao saber das condições - Brasil e nora de militar – ela, delicadamente, recusou. O pai, que sempre sonhara com o além-mar, ficou frustrado, mas arriscou consultar a mais nova, Takeko, sobre substituí-la caso o Sr. Ishida aceitasse a nova sugestão. A resposta foi pronta e firme: "Vou sim!". E tudo ficou acertado, apesar de que, logo após a saída dele, mãe e irmã tentaram dissuadi-la da decisão, considerando que aceitara a proposta por imaturidade e desconhecimento do significado de um casamento. Mas como lhe fascinava a idéia de conhecer o outro lado do mundo, inexplorado, de florestas virgens, animais selvagens e cafezais imensos a se perder de vista, os argumentos das duas foram em vão. Quinze dias após, embarcava com o Sr. Ishida rumo ao Brasil.

Com ela, na mesma cabine do navio, um casal e uma jovem, como ela, emigravam para a Argentina. A rotina no navio era intensa para ela porque, além de ajudar os tripulantes a lavar o convés, desde as cinco da manhã, após o café, por ser professora formada, dava aulas a crianças do primário e à tarde aprendia português com uma pessoa que já estivera no Brasil. Como gostava da comida ocidental servida na viagem e ainda lhe fora dada a chance de ver portos estrangeiros pela primeira vez, o mês e meio que durou a viagem passou rapidamente para ela. Entretanto, à medida que se aproximava do Brasil a realidade do casamento também se colocava diante dela, e até porque, certa vez, seu futuro sogro lhe perguntou sobre a possibilidade de seu filho recusá-la. Sua resposta veio instantânea, de uma nova idéia que se lhe abria: "Nesse caso prosseguirei viagem até a Argentina e depois retornarei ao Japão."

Finalmente, o navio aportou em Santos. No cais, a futura sogra e o futuro marido a aguardavam. Destino: colônia de Registro (SP), mais ou menos, a 200 km de Santos, de trem. A fazenda ficava 17 km mais adiante do centro da colônia, para onde seguiram na carroceria de um caminhão. O futuro sogro lhe dissera: "Plantamos 20 mil pés de café há cinco anos. A partir deste ano está dando muitos frutos. São frutinhas vermelhas, muito bonitas". Ela, que tinha em mente um cafezal extenso a se perder no horizonte, na realidade, viu montanhas e montanhas com a plantação de café.

A família seria composta pelos sogros e mais sete filhos, e seu futuro marido era o primogênito. A sogra mantinha, mesmo no Brasil, a postura de esposa de capitão e por isso não se dispunha a cuidar dos afazeres domésticos, além de se orgulhar de que, no Japão, seus filhos tinham sido criados por amas. Takeko que, ao contrário, vinha de família simples de lavradores para um lar de forte hierarquia militar, percebeu que não podia esperar boa acolhida. Só então compreendeu o choro de sua mãe ao tentar dissuadi-la daquela decisão. Chegou a se arrepender! Mas, pensando na mãe, irmã e principalmente no pai, concluiu que não poderia esmorecer. Para Takeko, o sogro considerava o lar como continuação da vida militar. Dava ordens, sem lhe consultar, e tinham de ser obedecidas. Se alguém o contrariasse, “raios e trovões" caíam-lhe sobre sua cabeça. Por isso os filhos apenas cumprimentavam os pais pela manhã e antes de se deitarem. Durante as refeições, todos, permaneciam calados do início o tempo todo e, ao término, retiravam-se.

Em sua primeira gravidez, Takeko enfrentou uma série de problemas. Não havia, na localidade, nem médico e nem parteira. No dia do parto, não pode contar com nenhum dos dois, sendo atendida por um assistente de médico da região. A criança nasceu, mas viveu por apenas alguns minutos. No ano seguinte deu à luz a uma menina, Emiko, e, dois anos depois, a Mariko. Além de cuidar das crianças, tinha como responsabilidade todos os afazeres domésticos dessa família numerosa e ainda ajudar nos trabalhos de secagem do café, o que a deixavam, física e emocionalmente, exausta. Porém, como havia decidido vir ao Brasil por própria vontade, mantinha-se firme. Entretanto, pensando no futuro das crianças, mais de uma vez achou-se indecisa quanto à permanência naqueles confins. Isso porque, em idade escolar, as crianças teriam de percorrer, diariamente, dez quilômetros a pé ou a cavalo, enfrentando todos os tipos de perigo de uma zona rural tropical, com chuvas praticamente todos os dias, muitas vezes, como temporais ou tempestades, com relâmpagos e trovões; sem contar as cobras venenosas, insetos e animais perigosos. Quanto ao futuro da fazenda, já havia indícios de declínio. Os vinte mil pés de café ainda produziam bem e davam lucros consideráveis. No entanto, o Governo decretou queima da safra do café, devido à superprodução nacional. Mas, como havia exceção ao café de exportação, de primeira qualidade, o marido de Takeko e seus companheiros pesquisaram o café despolpado, cuja amostra acabou sendo aprovada pelo Departamento de Exportação. Entusiasmados, empenharam-se novamente na produção do café. Todavia, essa alegria durou pouco, porque não conseguiram o crédito de exportação em virtude da quantidade insuficiente produzida nesse ano. Enfim, toda a esperança para o futuro parecia esvair-se.

Compreendendo não haver mais vantagem em ficar na fazenda, Takeko e o marido decidiram deixar o lugar, antes que as crianças chegassem à idade escolar, mesmo lamentando ter de magoar os demais membros da família. Por isso levaram meio ano para obterem o consentimento dos sogros e partirem para São Paulo. A filha mais velha estava com três anos e meio e a mais nova com um ano e meio.

Mais tarde, aproveitando essa abertura, os demais irmãos também começaram a se mudar, um a um, para São Paulo, restando na fazenda apenas os sogros dela, já idosos. Alguns anos depois, eles também acabaram indo para São Paulo, para morar com ela.

Mas na cidade, nem tudo foi fácil como imaginaram. Para o marido, que não tinha experiência de vida na cidade, era muito difícil conseguir o trabalho adequado, mudando constantemente de emprego. Para piorar, pouco depois, irrompeu a segunda Grande Guerra Mundial e o Brasil tornou-se país inimigo do Japão. O sogro, listado como militar do Japão, passou a ser considerado personagem perigoso ao governo brasileiro, o que deixou a família muito aflita, diante da possibilidade de sua prisão a qualquer momento. Certo dia, por denúncia de alguém, a polícia veio à casa em busca de objetos relacionados ao sogro. Depois da apreensão, enviaram-lhes uma multa e ameaçaram prender o sogro, caso não a pagassem. No fim, em 1943, os sogros acabaram sendo repatriados ao Japão, mas, ao menos, trazendo certo alívio à família. Com o fim da guerra e derrota do Japão, uma coisa inimaginável ocorreu entre os japoneses no Brasil, com o surgimento de duas facções antagônicas: do Japão que ganhou a guerra (“kachi-gumi”) e do que perdeu (“make-gumi”). Assim, a colônia japonesa dividiu-se. O marido de Takeko chegou a ser investigado pelo grupo da Shindo-Renmei (Federação de Súditos Fiéis), uma organização que defendia que o Japão, país divino, jamais perderia uma guerra. E chegaram até a matar consangüíneos da outra facção, sob a alegação de traição à pátria. Nessa época, o marido de Takeko viajava muito pelo interior para comprar produtos agrícolas, ficando pouco tempo em casa. Certo dia, em uma de suas ausências, apareceu um japonês, dizendo-se representante da Shindo-Renmei e afirmando que o marido dela estava na lista negra dos que seriam assassinados. E intimidou-a pagar 200 mil réis em troca de apagar o nome dele da lista. Essa quantia, na época, equivalia ao sustento de um mês de sua família. Mas preocupada com a vida do marido, entregou-lhe tudo o que tinha. No entanto, passados alguns dias, chegou outro homem, dizendo a mesma coisa. Até que surgiu uma terceira pessoa, a quem respondeu: “Japonês cruel! O senhor já imaginou sua esposa em meu lugar, na sua ausência? Eu acredito em Deus! Confiarei a vida do meu marido a Deus, porque não tenho mais nenhum tostão a lhe dar!”. A partir desse dia, ninguém mais apareceu.

E por causa desses incidentes, seus filhos passaram a ficar com medo dos próprios japoneses, chegando a lamentar terem nascidos filhos de japoneses e passando até a detestá-los. Takeko, preocupada com isso, pensava como fazer para que seus filhos, nascidos no Brasil, pudessem compreender o verdadeiro espírito do povo japonês. Então concluiu que, antes de tudo, ela e o marido deveriam apresentar-se a eles como pessoas a quem pudessem amar e confiar integralmente, porque educação familiar é conseqüência da conduta diária dos pais. A partir daí, ela começou a viver cada dia com extremo cuidado.

Como o marido ficava em casa apenas 68 dias por ano, por causa das viagens, ela tinha que desempenhar também o papel de pai, cuidando sozinha da educação e sustento das três filhas e de um filho.

Financeiramente, além de pagar os estudos das crianças, tinha de remeter uma determinada quantia aos sogros, idosos, no Japão. E para isso, a renda apenas do marido não era suficiente. Como não tinha aprendido nenhum ofício, depois de muito pensar ocorreu-lhe a idéia de abrir uma pensão para moças nisseis do interior que vinham a São Paulo. Assim, mudou-se para um local perto de escolas e inaugurou, em sua casa, o “Lar das Estudantes”. Nessa época, em São Paulo, poucos eram os lugares onde os pais pudessem deixar suas filhas, após terminarem o curso ginasial no interior, para continuar os estudos. Sua pensão tinha, em geral, 17/ 18 estudantes nisseis. Além de cuidar da alimentação e acomodação delas e de comunicar aos pais os gastos pessoais de cada uma, ainda lhe era pedido para que tomasse conta das que estavam em idade de saírem com rapazes. Foi uma época que lhe deixou inúmeras boas recordações.

A pensão ia bem e, nesse ínterim, a filha mais velha entrou na Escola Normal enquanto a segunda ingressava na Faculdade de Farmácia. Durante mais de 14 anos enviou pequena soma aos sogros no Japão, mas não conseguiu realizar o sonho mútuo de trazê-los de vez para o Brasil. Após cinco anos, desde a sua instalação, a vida da família melhorara um pouco e com isso conseguiu ter em mãos a revista “Fujin no Tomo”, que sempre desejou e da qual sua irmã era leitora assídua. Foi para onde acabou enviando sua história de vida (Raiz Transplantada – A Noiva do Cafezal, 05/1983), tendo-a publicada e premiada pela revista. Chegou, inclusive a ser sócia da “Tomo-no-kai”, por apresentação de uma amiga, Sra. Emiko Kurokawa.

A filha mais velha, que um dia dissera não gostar mais de japoneses, acabou se casando com um nissei, Tadashi Tachibanae é mãe de dois filhos (Alexandre e Humberto). A segunda também se casou com nissei, Myaki Issao, e tem três filhos (Débora, Silvio e Flávio). O filho Luiz tornou-se engenheiro e se casou com Shizue (Cecília), tendo dois filhos (Edson e Ieda) e a caçula Nicia que se graduou em Serviço Social e se casou com Humberto Jacobsen Teixeira, tem dois filhos (Christian e Pollyanao).

Depois que todos os filhos se casaram, seu marido começou a escrever poemas “Senryu” e chegando até à categoria superior desses praticantes, além de um relato (“Diário de uma viagem ao Nordeste do Brasil”) seu, publicado em japonês; enquanto Takeko começou a freqüentar aulas de cerâmica. Porém, pouco depois, o marido sofreu uma congestão cerebral e, a conselho dos filhos, passaram então a morar com um deles. Ela, que veio ao Brasil cheia de sonhos, sabe que nunca possuiu aquilo que sonhou, como o cafezal a se perder de vista, ou uma grande fazenda, mas, em compensação, considera que com os filhos e suas famílias, possui algo que lhe vale muito mais.

Em 1970 Takeko voltou ao Japão e reencontrando até colegas do curso primário, mas o marido se recusou a ir porque, segundo os costumes japoneses, deveria retornar ao seu local de nascimento, em Sasebo, levando presentes aos parentes e amigos. A Base Naval de Sasebo foi tomada pelos americanos depois da guerra. Ou seja, não teria nenhum amigo ou conhecido lá, somente inimigos, antigos inimigos. Agora transcorrido mais de setenta e cinco anos de Brasil, recorda-se de tudo com saudades e considera que foi bom que sua vida tenha sido vivida desse modo. Bem ou mal, contribuiu para criar nesta terra a raiz que aqui foi transplantada de um país distante chamado Japão.


O SOGRO TSUNEJIRO ISHIDA Tsunejiro Ishida, foi oficial (Kaigun Taisa) da Marinha Imperial Japonesa, participou da guerra contra a Rússia com o navio “Gunkan Harusame” e recebeu várias medalhas do governo japonês. Após se aposentar, comprou 35 alqueires de terra (ou as recebeu do governo japonês a título de recompensa por sua participação na guerra) em um país chamado Brasil. Chegou ao país com a família de seu sobrinho, Asashi Kawanami (para ficar no anonimato, por ser ex-militar), ao Porto de Santos, a bordo do “Takoma Maru”, em 1º de setembro de 1927, trazendo um pouco de tudo, inclusive uma vasta biblioteca. Como foram recebidos por uma banda musical, pensaram que se tratava de uma recepção devido à sua importância, mas era apenas devido à semana da Independência. Viajaram ao novo lar em Registro, na região do Vale do Ribeira (SP). Ficaram decepcionados, porque a mata virgem era toda fechada, a topografia desfavorável e o clima terrível. Sem opções, começaram a desmatar e a plantar 20 mil pés de café, e outros produtos, com a ajuda de caboclos locais. A região acabou sendo incrementada com escola e hospital, porém, o isolamento da civilização era terrível. O Sr. Tsunejiro chegou a retornar ao Japão para vender sua casa, que se localizava em um terreno enorme, na província de Fukuoka, a fim de aplicar no Brasil. Porém, em função da recessão no país, não conseguiu realizar o negócio. Então, aproveitando a viagem, resolveu trazer uma esposa ao seu primogênito, Takeshi (24). Por intermediação de um companheiro de farda, foi visitar a família de uma das indicadas por ele, mas recebeu uma negativa da que imaginou ser sua futura nora. Porém, acatou a sugestão de substituição pela irmã mais nova, Takeko, formada professora aos 17 anos e que, por ingenuidade ou espírito aventureiro, aceitara prontamente a proposta (leia a história dela acima). Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial, o sr. Tsunejiro ficou seriamente preocupado com a participação japonesa, porque sabia detalhadamente de sua limitação. Retornou ao Japão com esposa, por ordem do governo japonês (Kookansen), repatriados que foram do Brasil, deixando aqui o restante da família, com a recomendação para que não fossem para aquele país. Tsunejiro e esposa vieram a falecer no Japão sem terem realizado o sonho de retornarem ao Brasil a fim de morar com os filhos.